quinta-feira, 19 de setembro de 2013

TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA E INDISCIPLINA

A transposição didática tem tudo a ver com a indisciplina, principalmente no Fundamental II e Ensino Médio, onde os jovens não se mostram mais receptivos ao aprendizado passivo.
No artigo anterior “ Para que serve a Escola ?” foi colocado o desafio acerca do uso, função e objetivos da Escola. Partindo do pressuposto que tanto você quanto os seus alunos levantaram onde desejam chegar, darei prosseguimento em oferecer  uma ferramenta que talvez você ainda não utilize: a Transposição Didática. 
transposicao didatica
Caso não tenha ficado claro,  o exercício proposto no artigo anterior foi elaborado para provocar, tanto você quanto o seu aluno e fazer com que o mesmo começasse a pensar nos problemas da comunidade, no que ele deseja alcançar na vida e refletir onde a Escola entraria neste grande contexto.
Por ora, vamos nos ater a compreender o funcionamento de uma ferramenta que pode ajudar o aluno a ver a utilidade das disciplinas e conteúdos ensinados dentro da Escola. Esta ferramenta é a Transposição Didática.
 Lembra que já falamos que boa parte dos alunos não veem sentido em determinadas disciplinas e que por esta razão utilizam o tempo da mesma criando atividades que nada tem a ver com o planejado , abrindo assim  a brecha para a indisciplina, conversas fora de hora, bate-boca e um sem número de situações que tumultuam a aula e frustram o Professor? Agora vamos ver por quê isso acontece.
  
O que é Transposição Didática:
“ Professor pra quê serve isso?”, “ Professor, onde vou usar isso?” , “ Professor, pra quê aprender inglês se no Brasil todo mundo fala português?, “ Pra quê serve ângulo? Onde vou usar equação do 2º. Grau? Movimentos políticos? O que eu tenho a ver com isso?
Essas e outras “ perolas” devem fazer parte do seu cotidiano, pois com certeza você já ouviu algumas dessas afirmações na sua sala de aula. O fato é que os alunos não conseguem estabelecer um paralelo entre o aprendizado novo e o que já conhecem daquela nova situação por si só sem a mediação do Professor.
Cabe ao Professor ajudar o aluno a reconhecer ou identificar os saberes que já possuem acerca daquele elemento novo que está sendo introduzido. É por isso que quando o Professor apresenta um conteúdo novo sem realizar esta mediação e não estabelece a conexão do “ já conhecido” com o que “é desconhecido” ocorre, por parte do aluno, uma rejeição a algo que supostamente não tem aplicação e/ou serventia nenhuma na sua vida.
Conforme Yves Chevallard:

“Um conteúdo de saber que tenha sido definido como saber a ensinar, sofre, a
partir de então, um conjunto de transformações adaptativas que irão torná-lo apto a
ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O ‘trabalho’ que faz de um objeto de
saber a ensinar, um objeto de ensino, é chamado de transposição didática.
(Chevallard, 1991, p.39)

Por Onde Começar ?
O ser humano presta atenção naquilo que lhe diz respeito e que está relacionado a solução de algo que traga benefício próprio e/ou benefício coletivo. E se este “ benefício coletivo” puder ser aplicado diretamente no seu entorno (Ex. sua comunidade) para a solução de algo que lhe incomoda ou algo que possa impactar a todos com uma melhoria de vida, então esse “ algo” merece e deve ser aprendido, apreendido e utilizado.
Infelizmente, as nossas Universidades estão muito aquém de preparar os futuros Professores para esta visão de ensino-aprendizagem e não abordam, na prática a função social do conhecimento, pois somente desta forma é que haverá, de fato, o protagonismo do sujeito que aprende e transforma esse aprendizado, em tecnologias sociais capazes de trazer as mudanças da realidade instalada e alcançando assim a realidade desejada.
Realizar a transposição didática requer que o Professor além de ampliar seus conhecimentos no que refere-se a outras áreas de estudo, também desenvolva habilidades pedagógicas que possibilitem que ele saiba fazer a contextualização dos conteúdos.
Para isso o Professor precisa ser, como os jovens denominam “ o cara”, ou seja o expert, o Especialista naquele assunto. Se você ainda não é, aconselho: mexa-se e torne-se um. E neste caso, chamo de Expert aquele Professor que devido a “ fome” de conhecer, sai em busca de novos aprendizados, novas experiências, aventura-se em outras áreas do conhecimento , que tem o olhar curioso e enxerga que a vida pode ser “ desenhada” de outro modo, que sabe que ,onde há problemas a serem resolvidos, também há possibilidades de aprendizado.
Esse Professor Expert, esse “cara” liberta o conhecimento da estreiteza do livro didático e o traz para um novo ambiente, não mais o ambiente passivo das aulas expositivas, e sim para uma nova “arena” onde flui o diálogo. Por meio do debate esse conhecimento é trazido , não mais para ser “enfiado goela abaixo”, e sim para ser  escrutinado de tal forma que seja desafiado o seu valor até o limite em que esse novo conhecimento seja compreendido em seus significados a ponto de serem utilizados como ferramentas sociais de novas   ações transformadoras .

Competências necessárias para fazer a Transposição Didática:
A transposição didática pode ser entendida como uma competência que deve ser mobilizada constantemente pelo professor na sua prática pedagógica e ela ocorre, segundo Almeida (2011), quando:
  • · O conteúdo é selecionado ou recortado de acordo com o que o professor considera relevante para constituir as competências definidas na proposta pedagógica;
  • · Alguns aspectos ou temas são mais enfatizados, reforçados ou diminuídos;
  • · O conhecimento é dividido para facilitar a sua compreensão e depois o professor volta a estabelecer a relação entre aquilo que foi dividido;
  • · Distribui-se o conteúdo no tempo para organizar uma sequência, um ordenamento, uma série linear ou não linear de conceitos e relações;
  • · Determina-se uma forma de organizar e apresentar os conteúdos, como por meio de textos, gráficos, entre outros.

Consequentemente, para fazer transposição didática é necessário que algumas competências sejam desenvolvidas pelos professores, tais como:
  • · Saber fazer recortes na sua área de especialidade de acordo com um julgamento sobre relevância, pertinência, significância para o desenvolvimento das competências escolhidas que vão garantir a inserção do aluno no mundo moderno;
  • · Saber selecionar quais aspectos do conhecimento são relevantes;
  • · Dominar o conhecimento em questão, de modo articulado, incluindo o modo característico e específico pelo qual esse conhecimento é construído
  •  Dominar estratégias de ensino eficazes para organizar situações de aprendizagem que efetivamente promovam no aluno as competências que se quer desenvolver.
  •  · Relacionar os conteúdos das disciplinas e áreas com os fatos, fenômenos e movimentos da atualidade;
  • · Articular no trabalho de sua disciplina as contribuições de outras disciplinas e de outras áreas do conhecimento;
  • · Fazer uso das novas linguagens e tecnologias;
  • · Planejar e realizar situações didáticas utilizando os conhecimentos das disciplinas e áreas, dos temas sociais, dos contextos sociais relevantes para a aprendizagem e das didáticas especificas;
  • · Aplicar o princípio da contextualização dos conteúdos como estratégia de aprendizagem;
  • · Selecionar contextos, problemáticas e abordagens que sejam pertinentes à aprendizagem de cada saber disciplinar e adequados ao desenvolvimento do aluno;
  • · Utilizar diferentes e flexíveis modos de organização do tempo, do espaço e de agrupamento dos alunos;
  • · Manejar diferentes estratégias de aprendizagem considerando a diversidade dos alunos e os conteúdos;
  • · Selecionar, produzir e utilizar materiais e recursos didáticos, diversificando e potencializando seu uso em diferentes situações;
  • · Utilizar estratégias diversificadas de avaliação da aprendizagem e, a partir de seus resultados, formular propostas de intervenção didática;
  • · Promover uma prática educativa que considere as características dos alunos e da comunidade, os temas e as necessidades do mundo social.
  
Conclusão

Como você percebeu, não é tão simples desenvolver  competências sem que o professor busque constantemente o desenvolvimento como profissional, estudando e se capacitando. Segundo Almeida (2011, p. 32), o desenvolvimento de competências é “ estudar continuamente, formar-se continuamente, aprofundar-se, buscar, pesquisar, envolver-se com outros profissionais que possuem saberes diferentes dos nossos”.
Ser “ o cara” requer uma decisão da sua parte em busca do seu desenvolvimento pessoal e que, infalivelmente,  demandará no aprimoramento profissional também.
Fazer com que o “ saber acadêmico” sejam transpostos em novos “ textos do saber” que sejam escolarizáveis, conforme diz Chevallard, exigirá novas competências do Professor, e essas competências devem fazer parte da sua prática pedagógica.
Tarefá fácil?  Não! Porém é tarefa possível!
E então, que tal ser esse “ cara’.


Bibliografia:
ALMEIDA,Geraldo Peçanha de.Transposição didática: por onde começar? Editora cortez – 2011-71 pags.

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